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Familiares e amigos se despedem de Dominguinhos em São Paulo

Gabriel Mestieri e Tiago Dias

Do UOL, em São Paulo

24/07/2013 10h54Atualizada em 24/07/2013 19h22

Familiares e fãs de Dominguinhos acompanham o velório do sanfoneiro, que começou as 6h desta quarta-feira (24), na Assembleia Legislativa de São Paulo. O corpo ficará no local até as 16h, quando será levado para Recife, onde continuará sendo velado na Assembleia Legislativa de Pernambuco a partir das 6h desta quinta. A família planeja que o enterro seja realizado na sexta, no Cemitério da Paz, em Recife. O horário ainda não foi definido.

O cantor e compositor de 72 anos morreu nesta terça-feira no Hospital Sírio-Libanês, em São Paulo. O sanfoneiro lutava contra um câncer no pulmão e fazia sessões de quimioterapia havia seis anos. Segundo o boletim divulgado pelo hospital, as causas da morte foram "complicações infecciosas e cardíacas". O governador de Pernambuco, Eduardo Campos, decretou luto de três dias no Estado em virtude da morte do artista.

Durante o velório, Dominguinhos recebeu um Grammy latino póstumo pelo disco "Iluminado". O prêmio foi concedido em 2012 mas só foi entregue nesta quarta para a viúva do músico, Guadalupe Mendonça. Ele competiu com artistas como Daniela Mercury e Gaby Amarantos na categoria "Melhor Álbum de Raízes Brasileiras".

Ele partiu ouvindo a música "Casa Tudo Azul" (cantada pela filha Liv Moraes, por Guadalupe e Dominguinhos), do meu celular. Ele foi ouvindo até que o monitor cardíaco parasse. Essa música emocionava ele. Ele se controlava ao cantar. Ele foi ouvindo, abrindo os olhos, olhando pra mim. E eu disse: 'essa música representa nosso amor incondicional. Vá em paz. Obrigado por tudo que você me ensinou de bom'

Guadalupe Mendonça,
viúva de Dominguinhos

Guadalupe agradeceu aos fãs que rezaram pelo cantor e contou, emocionada, como foi os últimos minutos de vida dele. "Ele partiu ouvindo "Casa Tudo Azul" (cantada pela filha Liv Moraes, por Guadalupe e Dominguinhos), do meu celular. Ele foi ouvindo até que o monitor cardíaco parasse. Essa música emocionava ele. Ele se controlava ao cantar. Ele foi ouvindo, abrindo os olhos, olhando pra mim. E eu disse: essa música representa nosso amor incondicional. Vá em paz. Obrigado por tudo que você me ensinou de bom". Ela ainda disse que há muitas músicas inéditas de Dominguinhos, que serão editadas por ela em breve. 

Mauro da Silva Moraes, filho de Dominguinhos, também falou sobre a contribuição do pai para a música brasileira. "A melhor lembrança que tenho dele é a humildade. Na área dele, era o último dos moicanos", disse.

O músico Frank Aguiar também foi ao velório em São Paulo. "O Brasil está de luto e triste. Dominguinhos foi um dos maiores músicos, nos ensinou muito, principalmente na parte humana. Era uma pessoa muito afável e querida, rico de alma. Todos os músicos brasileiros, e ninguém dirá ao contrário, amam o Dominguinhos. É triste, mas chegou a hora dele. Ele é uma das maiores influências para os artistas, principalmente para aqueles do forró, como eu, pela forma harmoniosa que tocava. Era muito gostoso ouvir Dominguinhos, um músico de mão cheia. Ele cantava o amor, a poesia, o regionalismo. Sempre teve músicas de Dominguinhos no meu show, mas agora ele terá um cantinho só dele?.

A cantora Roberta Miranda, que fez parcerias com Dominguinhos durante a carreira, afirmou que não teve coragem de ver o corpo do sanfoneiro durante o velório, mas que decidiu comparecer para prestar solidariedade à família. "Graças a Deus consegui fazer uma homenagem a ele, em 2010", disse, em referência a "Forropeando", música que gravou nesse ano em parceria com o rapper MV Bill. "Ele ficou muito feliz com a homenagem. A cantora disse ainda achar "difícil que algum sanfoneiro atual consiga preencher o espaço deixado por Dominguinhos".

A dupla de repentistas Caju & Castanha, criada pelos irmãos José Albertino da Silva (Caju) e José Roberto da Silva (Castanha), também esteve no velório para prestar uma última homenagem. "A gente pode falar dele. Somos nordestinos. Viemos batalhar em São Paulo. Era uma pessoa humilde e generosa demais. Revolucionou a sanfona no mundo. A gente chegava com alguém que não era muito conhecido, mas que tinha muita vontade de cantar com ele e ele sempre cantava. Ganhamos o Grammy Latino dois anos depois dele. Ele ficou muito feliz. Era um padrinho", disse Castanha. "O mundo está chorando, mas o céu está em festa. Quando a gente se encontrava era sempre uma festa", disse Caju. 

Ele já estava meio assim. Colocou a mão no meu ombro e disse: 'hoje não estou legal'. O show era para ter 1 hora e meia, mas só teve 45 minutos

Eraldo Trajano, baixista de Dominguinhos

O baixista da banda que acompanhava Dominguinhos, Eraldo Trajano, emocionou-se ao chegar ao local. "É muita dor, Uma perda muito grande. Vai deixar saudade imensa", disse ele. Ele relembrou que subir ao palco com o sanfoneiro "era sempre uma caixinha de surpresa. Ele tinha o dom de Deus e sempre uma carta na manga", disse ao UOL

Eraldo também recordou o último show realizado por Dominguinhos, no dia 13 de dezembro de 2012, na cidade de Exu (PE), em comemoração ao centenário de Luiz Gonzaga. "Ele já estava meio assim. Colocou a mão no meu ombro e disse: 'hoje não estou legal'. O show era para ter 1 hora e meia, mas só teve 45 minutos".

A cantora Anastacia, que dividiu composições e apresentações com Dominguinhos durante muitos anos, relembrou do primeiro encontro. "Foi em 1966, fui cantar em um forró e ele estava. E a parceria começou, na música, na vida. A gente 'emendou os bigodes', como diziam. É uma perda muito grande".

A assessoria de imprensa do sanfoneiro, Ricardo Peixoto, informou que, nos últimos dias, Dominguinhos não estava sedado, mas não falava por conta de um cateter que tinha no pescoço. "Ele apenas segurava a mão e piscava os olhos".

Entre os primeiros fãs que chegaram estava o gari Edvaldo José da Silva. "Vim antes de trabalhar. Uma última despedida. Ouvia tanto o Luiz Gonzaga e o Dominguinhos. Uma perda muito grande", disse, emocionado, após ficar ao lado do caixão.

Homenagem de sanfoneiros
O velório de Dominguinhos teve momentos de emoção também quando um sanfoneiro cantou e tocou trechos de suas músicas. Targino Gondim, autor de "Esperando na Janela", do filme "Eu, Tu, Eles", conversou com o UOL depois de tocar músicas como "Eu Só Quero um Xodó, "Lamento Sertanejo" (parceria de Dominguinhos com Gilberto Gil), "Quem me Levará Sou Eu" e "Gostoso Demais".

"Foi emocionante a homenagem prestada a Dominguinhos, ele que fez tanto pelos sanfoneiros. Para fazer essa homenagem, tem que ser com a sanfona no peito. Sanfoneiro expressa o sentimento com a sanfona", afirmou o músico.

Funcionários da Assembleia
No início da manhã, alguns serventes da Assembleia Legislativa acompanhavam o velório. Reginaldo Felix da Silva, 36 anos, é conterrâneo do músico. "Ele é pernambucano como eu, homem guerreiro. Eu gostava muito das músicas, tocava muito em Recife e meu avô ouvia quando eu era pequeno".

O funcionário da Assembleia Legislativa de São Paulo, Edson Gomes Souza, 41 anos, nasceu em São Paulo e diz que seu pai ouvia as músicas de Dominguinhos. "É muito triste", disse.

"Meu pai não tinha defeito"
Muito emocionado, o filho do cantor e compositor Dominguinhos, Mauro da Silva Moraes, lamentou a morte do pai. "Meu pai não tinha defeito, não", afirmou, citando as características do músico que mais o marcaram. "Eu só guardarei coisa boa dele, era generoso demais", disse ao UOL na noite de terça.

Para o radialista Paulinho Rosa, amigo pessoal de Dominguinhos, o principal a se lembrar do músico é seu legado para a cultura brasileira. "Talvez um dos maiores gênios que tivemos", disse, citando em seguida aquilo que quem era mais próximo do sanfoneiro podia ver de perto. "Era especial, generoso, sempre muito bom."
 
O compositor Yamandú Costa se disse "arrasado" com a notícia. "É tudo muito triste. Acabei de saber da notícia e estou arrasado. Hoje o Brasil está de luto. Vou fazer um show aqui no Sul, estou rodeado por amigos dele. Hoje o meu show vai ser dedicado a ele. Não sei que música vou cantar, porque estou sem reação ainda", disse.
 
Chico Buarque lamentou a perda de "um amigo e um parceiro querido." Outra artista de peso, a sambista Beth Carvalho, destacou a falta que Dominguinhos vai fazer. "Ele era um grande compositor e uma grande pessoa. Estou lamentando profundamente a morte dele", disse a cantora.
 
Ivete Sangalo desejou paz a Dominguinhos. "Sentirei saudade do seu sorriso, mas você é maravilhoso e nos deixou a sua música", escreveu. Frank Aguiar também aludiu ao paraíso para celebrar o artista. "Mestre Dominguinhos, que Deus te receba num cantinho mais especial do Céu!"
 
Os cantores Fagner, Elba Ramalho, Flávio José, Nando Cordel, Geraldo Azevedo, Jorge de Altinho e Liv Moraes farão um show em homenagem a Dominguinhos no dia 25 de julho, em Recife (PE). A renda será destinada à família, para ajudar nos custos da hospitalização e do funeral do músico.
 

Nascido em 1941, José Domingos de Morais, o Dominguinhos, veio de uma família humilde de Garanhuns (PE) e herdou os dotes musicais de seu pai, Chicão, que era sanfoneiro. Com seis anos de idade, aprendeu a tocar sanfona e ia a feiras livres para arrecadar dinheiro.

Quando criança, ele formou o trio Os Três Pinguins com seus dois irmãos Moraes (sanfona) e Valdomiro (malê, uma espécie de zabumba). Aos nove anos, já era proficiente em sanfonas de 48, 80 e 120 baixos. Logo depois, ele conheceu Luiz Gonzaga na porta de seu hotel. O músico ficou impressionado e chamou Dominguinhos para ir ao Rio de Janeiro. Mais tarde, ele fez parte da equipe de Luiz Gonzaga e foi reconhecido por cantores da Bossa Nova, Gilberto Gil, Maria Bethânia, Elba Ramalho e Toquinho.

A cantora pernambucana Anastácia fazia parte do grupo de Gonzaga e não demorou a fazer parte da vida de Dominguinhos. Os dois iniciaram uma parceira dentro e fora dos palcos, que os levou ao casamento.

No entanto, o casamento com Anastácia não deu certo e Dominguinhos acabou se envolvendo com outra cantora, também pernambucana, Guadalupe. Os dois se casaram e a festa contou com convidados ilustres como Luiz Gonzaga e Genival Lacerda.

O primeiro disco de Dominguinhos foi "Fim de Festa", lançado em 1964". O último foi "Yamandu + Dominguinhos", em 2008. Ao longo dessas décadas de carreira, lançou dezenas de discos. 

Em 2002, Dominguinhos foi vencedor do Grammy Latino com o CD ?Chegando de Mansinho?. Já em 2010, ele foi vencedor do Prêmio Shell de Música.

Entenda o quadro de saúde
Dominguinhos deu entrada no hospital Hospital Santa Joana, em Recife, no dia 17 de dezembro, com arritmia cardíaca e infecção respiratória. No dia 22, precisou passar por uma cirurgia para a colocação de um marca-passo cardíaco temporário por conta da arritmia.

O cantor foi submetido a uma traqueostomia e hemodiálise. Dominguinhos ficou sem sedação e, mesmo assim, não se comunicava com a família e médicos. No dia 8 de janeiro, ele sofreu uma parada cardíaca no hospital, que foi revertida. A pedidos dos familiares, no dia 13 de janeiro, Dominguinhos foi transferido para o Hospital Sírio-Libanês em São Paulo.

Em março, Mauro chegou a declarar que o quadro do pai era irreversível. A família já havia sido informada do estado de saúde do músico havia alguns meses, mas somente nessa época Mauro decidiu divulgar a informação, em respeito aos fãs.

"Estava tentando resguardar meu pai, mas essa é uma informação que as pessoas precisam saber. Dominguinhos é uma pessoa pública e adorada no Brasil inteiro. Muitas pessoas me perguntavam sobre meu pai e acho que chegou a hora de falar", disse ao UOL.

Diagnosticado com câncer de pulmão havia seis anos, Dominguinhos sofreu um princípio de infarto no início de 2011, quando foi internado no Hospital Albert Einstein, em São Paulo.  Ele foi submetido a um cateterismo e a uma angioplastia. Por conta de seu estado de saúde, começou a cancelar shows no final de 2011.